segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Um consenso sobre a inovação tecnológica no Brasil

Um consenso sobre a inovação tecnológica no Brasil17/02/2011 - Wellington Freire

Publicação: O Globo

Observando a criatividade dos comerciantes da favela de Heliópolis, em São Paulo, para atender as necessidades de abastecimento dos seus moradores, a revista britânica "The Economist" disse, em reportagem publicada no final do ano passado, que o Brasil poderia buscar inspiração nas suas favelas para criar produtos e negócios mais inovadores para o seu mercado interno.

Apesar do sucesso internacional da economia brasileira, as nossas empresas estão fazendo bem menos do que suas rivais da Índia e da China (falando apenas dos BRICs) para dominar a arte de produzir mercadorias baratas para as massas. Se produtos e serviços inteligentes para os mais pobres enchem as prateleiras das lojas hoje no País, a quase totalidade é pensada e produzida no exterior, especialmente na China.

A reportagem da revista "The Economist" chama assim a atenção para um fato particular do desenvolvimento nacional que contraria um fundamento geral da teoria econômica, onde se aprende que o que deve ser exportado, por razões óbvias, é o excedente e não o principal da produção. Por conta da dinâmica econômica brasileira, marcada historicamente pela dependência externa, as empresas são estimuladas a buscar o mercado global, em detrimento da produção de mercadorias para consumidores locais.

Criar, então, produtos mais inteligentes e, portanto, mais inovadores, para os brasileiros, nos coloca de frente não apenas com o perfil tradicional da indústria nacional, mas também com a questão de como equacionar a relação entre ciência, tecnologia e inovação. Coisas que, apesar de distintas, aqui são sempre postas no mesmo escaninho de políticas públicas sob a sigla genérica de CT&I. Das três, para as empresas, a inovação é a pedra angular, já que é pilar estruturante da competitividade econômica.

Por isso, um confronto da posição do País diante dos concorrentes internacionais, no quesito Inovação, está hoje longe de nos tranquilizar. Um estudo divulgado pelo Fórum Econômico Mundial mostra que o Brasil caiu da 50ª para a 68ª posição no ranking mundial em 2010. Já dentre os países latino-americanos, onde era o 3º mais bem classificado até 2009, o país ficou apenas na 7ª posição ano passado, perdendo para nações como Chile, Uruguai e Costa Rica.

Já o Índice Global de Inovação, registra os obstáculos do setor no Brasil: infraestrutura deficiente, desigualdades sociais, falta de grandes investimentos em educação primária e secundária, e, por último, mas não menos importante, as dificuldades de proteção da propriedade intelectual. A par dessas deficiências estruturais, o Brasil precisa desenvolver um consenso em torno da inovação que leve em consideração as empresas.

Reconhecemos o papel fundamental e estimulador da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e do Ministério da Ciência e Tecnologia na concessão de créditos financeiros, ainda que falte um melhor entendimento do Governo em outras áreas. Apesar dos reconhecidos avanços trazidos pela Lei de Inovação, assinada pelo presidente Lula em 2004, especialmente no seu Capítulo IV denominado "do Estímulo à inovação nas empresas", ainda hoje o processo de registro de uma patente no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) demora de 8 a 10 anos. Essas inconsistências explicam, em parte, a baixa atividade das empresas brasileiras.

Nesse sentido, o País poderia considerar a longa contribuição de algumas empresas multinacionais sediadas no País, principalmente as que possuem uma visão, como a IBM, de que a inovação não está mais restrita aos laboratórios de P&D das grandes empresas ou das universidades, mas que pode estar, como no alerta da "The Economist", até mesmo nas favelas. Através de parcerias com essas empresas poderemos não só inserir inovações brasileiras no mercado global, mas também incrementar a inovação nativa.

Muitas vezes, a vida prática, como o dia a dia em uma favela de São Paulo, Rio ou Distrito Federal, coloca para as empresas demandas inovadoras a partir da boa idéia de alguém, que o mundo corporativo transforma em produto. A liberdade de criar olhando, fazendo e quebrando a cabeça para fazer melhor aquilo que outros fizeram antes vem sendo um dos mais potentes motores do desenvolvimento tecnológico nos países do leste asiático, hoje líderes nos processos de inovação no mundo. O Japão, depois da Segunda Guerra Mundial, e a China, Coréia do Sul e Cingapura são exemplos vivos de que esse modo de pensar pode dar certo.

A inovação brasileira é um jogo complexo, mas necessário para apoiar o desenvolvimento econômico do País. Entendemos que o futuro do Brasil, depende não apenas da educação formal de seu povo, mas também da sua capacidade de inovar e de gerar patentes que possam ser acrescentadas aos resultados de sua economia.

Mas é preciso entender que cabe às empresas a criação, produção e colocação no mercado dos produtos resultantes da inovação. Esse protagonismo empresarial implica responsabilidades, mas exige, por outro lado, instrumentos públicos desenhados com clareza, de acordo com as necessidades e imperativos para fazer da inovação uma ferramenta real de alavancagem da economia do país. Esse é o consenso que precisamos atingir.

Wellington Freire é presidente da empresa vencedora do prêmio Finep "Pequena Empresa mais Inovadora do Brasil" em 2010.
Fonte: http://www.protec.org.br/artigos_detalhe.php?id=418&Um consenso sobre a inovação tecnológica no Brasil

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